08 novembro 2020

QUANDO NÃO HÁ POESIA NO SILÊNCIO

                                                                      ( Eric-Drooker)

                                                    

Não tenho medo do escuro, mas do silêncio. Um tipo de escuridão onde a luz não penetra. Silenciam os que têm poder para influenciar a sociedade, silenciam os dotados de sabedoria para conduzir, silenciam os que podem mudar situações, revelar fatos escusos , denunciar abusos e crimes. Vivenciam o medo ou são levados pelo equivocado pensamento de que não têm responsabilidade para com a sociedade.  Nem é preciso chegar à sociedade maior. Esse silêncio está presente nas pequenas e grandes empresas, na família, nas relações de amizade. Um silêncio que, se não tortura quem por eles fez a opção, machuca terceiros por um longo tempo, até que a coragem faça surgir uma voz a ser seguida, um caminho novo a ser partilhado.

Muitos de nossos conhecidos cientistas, descobridores, provocadores de mudanças, só conseguiram seus feitos porque não se mantiveram em silêncio. Foram chamados loucos, sofreram, mas nos deixaram benefícios incontáveis.
                                                     
Mas não precisamos chegar a tanto. Há silêncios que destroem vidas, que amarguram pessoas, que permitem a manutenção da incompetência, da corrupção, da promiscuidade. Há silêncios que contribuem para a escravidão (dita como não existente), para a dor, para a construção de muros que escondem caminhos. Silêncios que destroem a esperança.

O vizinho espanca a mulher, mas nada temos com isso. O tio abusa dos sobrinhos, mas o problema não é nosso. O garoto está envolvido com elementos perigosos, sem que a família saiba, mas isso não é da nossa conta. Alguém está se aproveitando de cargos e usufruindo de benefícios indevidos, mas precisamos garantir nossos empregos e fingimos nada perceber. Os pais estão maltratando os filhos, mas aqueles olhinhos sofridos não provocam o nosso grito de indignação. Optamos pelo silêncio e por cuidar apenas de nossas vidas.

Talvez estejam os homens justos cansados de não serem ouvidos. Alguns até se arriscam, mas são silenciados por meios que ninguém conhece. E abafam os gritos da consciência com a justificativa de que, propagando a verdade, serão eles a receber o castigo que deveria ser dado aos culpados. De certa forma, nem podemos proferir juízo de valor, eis que também temos medo de ser totalmente honestos, frente a ocorrências que não nos envolvem, diretamente.

É triste o silêncio, em muitas ocasiões. E o pior é que sabemos não ser ele, sempre, uma opção, mas imposição advinda da falta de segurança que envolve todos, atualmente. Nossos sentidos não sofreram qualquer dano, mas não vemos, não ouvimos, não falamos, por decisões pessoais. Fazemos como muitos políticos que, ao serem questionados sobre irregularidades praticadas em suas gestões, limitam-se a dizer que nada sabem a respeito, gozando da imunidade que lhes é conferida...


                                                         Marilene


                                                                 
                                                                     

25 comentários:

  1. Bah, chega a arrepiar de tão fortes tuas palavras, Marilene! Colocaste lindamente esse tema... Há silêncios poéticos e esses aqui nada de poesia tem. Esses sufocam, machucam, ofendem... Falaste tuuuuuuuuuuuuuuuuuuudo! Adorei ler! E ainda quanto aos políticos, há por vezes silêncios que só justificados pela insanidade do que ouvimos ou lemos, quando ele é quebrado. Por vezes, como no caso bem atual, melhor ficar quieto, admitir do que quebrar o silêncio escrevendo ou falando besteiras que mostram não saber perder! beijos, tudo de bom,chica

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    1. Chica, esse silêncio é devastador quando impede que se faça justiça a muitos. Quanto aos políticos, alguns deveriam , ao contrário, fazer uso dele rss. Bjs.

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  2. Oi Marilene.
    Há silêncios e silêncios. Algumas vezes silenciar evita o pior. Outras vezes ele é o pior que alguém pode fazer consigo mesmo e com todos que o rodeia.
    Mas sua silenciosa visita me fez bem.
    Xeru

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    1. Para encobrir verdadeiros crimes, é catastrófico. Para não se insurgir contra falcatruas e injustiças, também. Vozes precisam ser ouvidas. Obrigada, querida. Bjs.

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  3. Gostei muito deste seu texto. Quanta verdade aqui exposta!
    E por vezes há um cansaço que se apodera das pessoas por não verem frutos... e silenciam... ou são silenciadas.
    Os silêncios de quem deveria intervir emperra o mundo.

    Beijinhos.

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    1. Para alguns, é uma obrigação. E não a cumprem. Para nós, um gesto de solidariedade que pode ser praticado até no anonimato. É muito perigoso o silêncio. Bjs.

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  4. Bah... Marilene, você foi muito feliz nessa sua crônica que não foi silenciada. Sim, também existem silêncios necessários para evitarmos uns barracos catastróficos, que não trazem nada de bom se certas atitudes não forem silenciadas, mas não é esse silêncio que você se refere. Esses malditos silêncios são aqueles que aniquilam, que poderiam ajudar e destroem, que precisavam delatar e se escondem, e nós sabemos onde estão e quais são. Sempre existiram, isso é próprio dos humanos, estão em todos os lugares, em milhares de bocas que se calam por covardia ou para o bem próprio. Fui descendo a crônica e tão claro esses silêncios!! Quem não sabe onde estão?
    Parabéns, querida, você vai fundo.
    Beijo, um ótimo domingo.

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    1. Para evitar barracos é louvável, Tais rss. A covardia e a defesa dos próprios interesses alimenta o silêncio devastador que conhecemos bem. Muitíssimo obrigada, querida, por seu ótimo comentário. Linda semana para você e o Pedro. Bjs.

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  5. Bonita e profunda reflexão sobre a violência entre humanos

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    1. É sobre silenciar quando as vozes precisam ser ouvidas. Nos abastemos de nos manifestar e acabamos contribuindo para o sofrimento de quem caminha bem perto de nós. Muito obrigada, poeta! Abraço.

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    2. Sempre necessário e bom analisar e opinar sobre o que nos faz mover enquanto seres pensantes
      😊

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  6. Muito bom, Marilene! Fez-me lembrar aquela máxima: "Para que o mal triunfe, é necessário apenas que o bem se cale!". Meu abraço, amiga; boa semana.

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    1. Meu amigo, uma frase que diz tudo. Ótima semana também para você. Que já esteja recuperado. Abraço.

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  7. Ola Marilene, encontrei hoje seu blog, que sorte a minha... Faço minhas todas as suas palavras e sentimentos de dor e desilusão crescente.
    Quando percebo todas essas situações e mesmo me amargurando sei que o medo de em certos casos denunciar é bem perigoso. saber e divulgar o que vejo não resolve, é necessário botar a "cara a tapa" buscar a autoridade competente para as devidas providências... Mas onde está ou estas autoridades não corruptas? Onde?
    Beijinhos

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    1. É um prazer recebê-la. Hoje, o medo até impede que se rompa o silêncio, embora haja meios para que denúncias sejam feitas no anonimato. Até as autoridades nos dão insegurança, o que jamais deveria ocorrer. Bjs.

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  8. O pior é que esse silêncio vem de onde não deveria vir. Muitos que, obrigatoriamente, deveriam abrir a boca, se calam em benefício próprio, receosos de secar o peitinho em que mamam. Bela e muito pertinente a tua crônica Marilene.

    Abraços e uma ótima semana para ti e para os teus.

    Furtado

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    1. Está muito certo, Rosemildo. Os interesses pessoais falam mais alto e impedem que ações sejam praticadas, com vistas ao bem comum. Abraço.

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  9. MArilene
    Um texto muito lúcido e com muita reflexão.
    Quanta verdade nele encerra.
    Gostei de ler.
    Beijinhos
    :)

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    1. Piedade, um silêncio que é abraçado em todos os cantos do mundo. Obrigada pelo comentário. Bjs.

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  10. Uma dissertação muito abrangente sobre o silêncio criminoso,
    porque quem sabe e não denuncia, torna-se conivente.
    Mereciam penas pesadas.
    Penso que é questão de educação cívica, nós temos evoluído
    a nível social, mas pouco nas altas esferas...
    Gostei de ler, Marilene,
    Tudo bom. Bjs
    ~~~~

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    1. Perfeitas colocações, Majo! Nossa evolução ainda não nos levou a colocar a necessidade de justiça onde deveria estar. Obrigada por seu comentário. Bjs.

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  11. A cegueira que incomoda,
    a mudez diante os fatos,
    a surdes dos gritos dos justos.
    Eu me incomodo com esta tríade proliferando
    e fazendo escola amiga.
    Um texto e imagem que acorda um sentimento abafado,
    um sentimento de repulsa à toda inércia da justiça.

    Carinhoso abraço

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    1. Você foi perfeito, meu amigo. É dotado de sensibilidade e faço coro ao seu incômodo. Grande abraço.

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  12. Boa noite Marilene. As vezes com o nosso silêncio temos influência sobre uma vida de uma pessoa e que também pode afetar a nossa vida também. O problema que as vezes o arrependimento vem tarde e com consequências. Um excelente domingo.

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    1. Luiz, esse silêncio que machuca acaba trazendo, de fato, arrependimento, quando percebemos que poderíamos ter evitado as dores de outrem. Muito obrigada pela presença e comentário. Ótimo domingo de eleições para você!

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