23 agosto 2020

UMA SIMPLES VOLTINHA

(Abdi Asbaghi)

                                               

Com a abertura do comércio em alguns dias da semana resolvi dar uma voltinha. Confesso que saí de casa com grande receio, mas sentia necessidade de ver gente, de me movimentar um pouco. E também de olhar vitrines, sem interesse em fazer compras pois o que não preciso, de forma alguma, é de roupas novas. Tenho várias que ainda permanecem com as etiquetas, presentes de Natal e de aniversário.

Primeiro, tinha que definir meu destino, já que em meu bairro não posso caminhar sem encontrar conhecidos, principalmente as lojistas , com as quais mantenho contato há muitos anos e, de cliente, virei amiga. Tudo bem, pensei, vou a uma região comercial próxima.

Outra decisão: o carro. Não poderia deixá-lo em estacionamento. Como confiar nos cuidados de higiene de quem iria manobrá-lo? 

Pois bem, rasguei minhas naturais barreiras e fui!!!!! Coloquei o carro em zona azul, facilmente. Vagas não faltavam. E dei início à tarefa à qual me havia disposto... uma simples voltinha.

Vixe! Planejara caminhar em ruas quase desertas e me surpreendi. Até me lembrei de alguns bairros de São Paulo, das regiões centrais das grandes cidades, das feiras e mercados, dos quais sempre fugi, independente da situação que ora vivemos. Muita gente!

Os vendedores estavam caçando clientes nas calçadas. Traziam peças nas mãos e se aproximavam, apresentando as vantagens delas, seu baixo custo, seu conforto. Que desconforto! Eles davam um passo para a frente e eu dava dois para trás ou para o lado.
Pude observar que as máscaras da maioria dos vendedores não cobriam o nariz. Com a ansiedade de oferecer, de vender, elas lhes causavam dificuldades de comunicação.

Dei uma volta no quarteirão mas não pude apreciar nada, pois tinha que fugir das tais ofertas. Se bobeasse, seriam colocadas diante do meu rosto, sem constrangimento.

Senti vontade de tomar um café, que amo e que, na vida antiga , sempre fez parte das minhas voltinhas. Mas, como fazê-lo??? Havia lanchonetes abertas, mas com balcão impedindo a entrada, na forma determinada pelas normas vigentes. Eu nem precisava dele, já que não iria realizar tal façanha, embora saiba que outros não teriam receio de entrar. Parei diante de uma. Olhei, olhei, olhei e pedi ajuda a Deus antes de solicitar um café em copinho descartável. Tomei sem meu costumeiro prazer, de tanto medo. E haja álcool gel.

As expressões das pessoas, lidas no olhar que me dirigiam, causavam tristeza. O tal desconforto estava dos dois lados, dos que lutavam para vender e dos inseguros clientes.

Confesso que minha voltinha foi curta. Retornei ao sossego do meu apartamento com um cansaço tão grande, que nem podia entender. Parecia-me ter participado de alguma maratona. Tomei um banho, recostei no sofá do escritório e... dormi. Estava brigada com meu confinamento e me reconciliei com ele, prazerosamente.

Que saudade das voltinhas que dava naquela minha outra existência! Chegava em casa feliz, independentemente de ter ou não uma sacolinha nas mãos rss. Trazia da rua observações, lembranças, conversas soltas que me chegavam distraidamente, pedaços de vida que acabavam se somando à minha e que, certamente, me trariam reflexões posteriores.

Fazer o que, né????? Ficar quieta. Única opção. Saída, só para o supermercado. E olhe lá!!!

                                                                      

                                                                                              Marilene




32 comentários:

  1. Que triste tudo isso... Tantas expectativas temos para uma simples voltinha! E o medo que temos que ter, digam que é ou não bobagem. Ele existe e o vírus é real,apesar de... Aqui ainda estamos SÓ em casa. E vejo outros que se aventuram,sem o menos medo a fazer cruzeiros..Credo. Será somos diferentes? Feitas de outra massa?rs Lindo domingo! bjs, chica

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    1. São responsáveis os que colaboram. Nem me fale em cruzeiro ou viagens, Chica. Eu adoraria ver o mar, mas sei que, tão cedo, não será possível matar a saudade que sinto dele. Bjs.

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  2. Nos causa espanto a proporção das mudanças que saltam das rotinas antes tão simples, tão comuns e conhecidas...uma simples voltinha e um cafezinho. Parece que fizemos uma grande ousadia além das nossas capacidades.
    Eu, vou caminhar na areia desde que a permissão se deu. Céu aberto, mar constante; um mercado uma vez na semana e casa.Consigo conviver melhor com a realidade me aproximando da natureza.
    Lindo domingo e igual semana pra vc.
    Bjssss,
    Calu

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    1. Calu, sempre brinco que gostaria de trazer um pouco de mar para Minas. Essa caminhada que você pode, agora, fazer, é maravilhosa. Ar livre, natureza... Isso ajuda a gente a suportar o isolamento. Bjs.

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  3. Paciência amiga, pois tudo vai melhorar. O mais importante é termos FÉ em DEUS.

    Abraços e uma ótima semana para ti e para os teus.

    Furtado

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    1. Essa é a esperança de todos, Rosemildo. Que a fase passe e que voltemos a sair sem medo. Abraço.

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  4. Estranhamentos. A minha primeira saída foi para caminhar no calçadão, quando em Niterói houve a primeira abertura. E realmente, tudo assusta mais que nos alegra. Mas de pouco em pouco podemos agir de forma que nos sentimos melhor. Bjs

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    1. E como estranhamos, Norma!! Você vê o mar e pode caminhar no calçadão, um presente. Esta semana a liberação aumentou em BH, mas isso até causa medo. Bjs.

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  5. Juro que entendo você, amiga! Pessoalmente, não saio desde meados de março; e, claro, às vezes sinto falta disso. Mas o que me detém é exatamente o receio de uma experiência do tipo; à medida que o tempo passa, as pessoas preferem achar que o perigo já se foi. A única vantagem que levo é que tenho uma máquina de café expresso em casa; adoro essa bebida! :) Meu abraço, boa semana.

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    1. Um café expresso à disposição! Que beleza! Sabe que gosto de coar o meu, sentir aquele cheirinho delicioso??? Não costumo sair, só para o supermercado. Essa minha voltina não foi uma boa experiência rss.

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  6. Olá, Marilene, nestes tempos de pandemia o lugar mais seguro mesmo e mais confortável é a nossa casa. Sempre que saímos nos sentimos inseguros, e a segurança só virá com a vacina. Gostei de ler sobre a tua saidinha, o mesmo acontece por aqui, saio, mas com temor e desconfiança.
    Uma boa semana, com saúde.
    Um abraço.

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    1. Pedro, muitas pessoas saem sem medo, mas eu o sinto. E me preocupo, não só comigo, mas com minha família. Linda semana também para você e para a Tais.

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  7. Estamos sentindo falta de coisas tão banais, Marilene. Eu de ir ao cinema...Mas agora tenho ido algumas vezes fazer compras e coisas do tipo, mas sempre rápido.

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    1. Sérgio, creio que o cinema, como antes, ainda vai demorar. Você, como escreve sobre programas de televisão, tem em casa seu objeto de trabalho. Com isso se ocupa, o que é muito bom.

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  8. Oi, Marilene. Tenho dado minhas voltinhas desde o final de julho. No final de semana, saímos para almoçar fora. Não tenho medo, e confesso que só uso a tal máscara porque é obrigatório, mas não confio na eficácia dela - pelo contrário, aquele pano suado e cheio de gas carbônico é um abrigo confortável para germes, bactérias e vírus. Após algumas poucas horas, ela fica úmida e fedorenta. Detesto, tenho o maior nojo dessas máscaras. Sem falar naquelas que a gente não sabe qual é o lado direito e o do avesso, e acaba recolocando-as do lado errado, aspirando todas as sujeiras possíveis.

    Não vejo a hora de voltar À normal normalidade - porque usar esse pano não é normal.

    Abraços.

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    1. Ana, você me fez rir. Como as máscaras incomodam, né??? A Vera, minha irmã, tem sinusite e problemas alérgicos. Disse que vai ao supermercado e fica louca para voltar, só para tirá-la. Temo que ela vire um acessório indispensável, daqui para a frente. Até pensei em comprar as descartáveis, já que não requerem tanto cuidado depois do uso. Bjs.

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  9. Maldita doença que nos tolhe a vida de tantas formas diferentes.
    Será que estamos a pagar o preço pelo que andamos a fazer ao nosso planeta e ao nosso estilo de vida?
    Começo a acreditar que sim

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    1. Temos muitas dívidas, realmente. O momento é até oportuno para se refletir sobre elas, embora não acredite em mudanças efetivas. Só acontecem no papel assinado pelos detentores do poder. E olhe lá! Se o fizerem! Por vezes me sinto em um filme de terror rss.

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  10. Oi Marilene
    Eu morava numa cidade grande quando fiquei viúva aos 37 anos e com um filhinho adotivo de 2 anos. Morava em Santo André, era concursada.
    Casei-me novamente com um homem maravilhoso.
    Hoje faço 73 anos.Pode? Mama mia.
    Beijos
    Lua Singular

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    1. Parabéns, querida! Uma companhia maravilhosa, como menciona, é um presente especial. Que comemore muitos outros, com bênçãos e alegrias! Bjs.

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  11. Olá, Marilene,
    que crônica gostosa de ler, tão bem contado esses meses com essa infeliz pandemia, nunca imaginamos que um dia passaríamos por isso. Pois eu me vi em você! Sair, dar uma voltinha louca de medo, ver os vendedores ansiosos querer vender o máximo. Desconfiada vou ficar por uns bons meses quando conseguir aplicar a vacina que desconfiarei, pois vejo que estão tateando. Espero que venha uma que nos cubra de segurança só em olhar para a agulha. Nunca imaginei as pessoas desconfiarem tanto umas das outras, na verdade não é delas, é do vírus que pode estar escondido onde menos imaginamos. Descer o elevador já começa a desconfiança, abrir as maçanetas das portas outra desconfiança... Penso que ainda vai longe esse vírus, todos os anos vamos ter mais vacina do covid 19, como outras gripes. Na verdade não sei se vou saber andar nas ruas, entrar numa cafeteria, pedir um café com pão de queijo que adoro. Quanto as máscaras, quando coloco tenho de tirar os óculos, os dois juntos não se dão muito bem, embaça toda e não enxergo nada. O bom mesmo é ficar em casa, na sacada!! rsss
    Maravilha de crônica, vai ficar na história para contar aos futuros estudiosos o ano de 2020 no Brasil, o espírito do brasileiro!
    Beijo, boa semaninha em casa rsss.

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    1. Vou confessar uma coisa. Fiquei uma semana rezando para não ter sio contaminada em minha voltinha rss. Você falou dos óculos e vivo implicando com minha sobrinha por estar sem máscara, mas ela diz que só pode usar uma coisa ou outra e que não consegue enxergar para dirigir, sem eles. No condomínio, recomendam que o elevador só seja usado por uma pessoa, salvo se da mesma família. Mas como impedir que alguém entre? E considero até exagero , se forem duas ou três. Mas não me arrisco a ir ao médico, por exemplo. Em prédios de consultórios eles ficam lotados. Você está certíssima, até na vacina vamos demorar a confiar. Tempos difíceis, não?????? Grande abraço!

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  12. Oi querida,
    Nem a supermercado vou, meu marido sabe meus gostos e compra
    Vou dormir, estou com muita dor nos pés.
    Beijos no coração
    Lua Singular

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  13. Essa coisa me trancou não só dentro
    de casa como dentro de mim. Me borro
    só de pensar num tubo enfiado na minha
    goela, isso se o doutor não tomar qualquer
    coisa depois do almoço. Do jeito que a sorte
    anda longe de mim, vai que o tubo é enfiado
    onde não deve.
    Um beijo e vamos deixar de paranoia, diriam
    alguns.(risos de molhar as calças)

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    1. Silvio, rir nos faz bem. Estamos trancados dentro de nós, realmente. O lado bom é que pensamos mais. Muitos não abraçam o medo, mas ele é forte. Defendo os profissionais da saúde e os admiro, mas como não existe remédio para o vírus, temos que contar, em caso de contaminação, com a sorte de cair nas mãos daqueles que escolheram a medicina por ideal. Grande abraço.

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  14. Tristes os efeitos desta pandemia!
    Se não arriscarmos, acabaremos deprimidos pelo isolamento. Afinal, tivemos que abrir mão de muitos hábitos e até de rotinas que preenchiam os nossos dias e nos traziam prazer.
    Manter a vigilância é preciso, mas continuar a viver é imprescindível.
    Também só saio para o imprescindível. As máscaras me sufocam.
    Adorei a crônica, mana!
    Beijão.

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    1. É isso aí!!!!! rss. Agora, que já está tudo aberto, temos que dar uma voltinha, mantendo os cuidados. Como esse isolamento não tem tempo definido para acabar, é preciso perder um pouco do medo. Bjs.

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  15. Nossa Marilene, tá difícil a situação...o novo normal não é nada normal. O shopping daqui abriu e eu nunca fui lá,só vou ao trabalho e ao supermercado,as vezes na farmácia.Domingo passado escapuli e fui na praia,não tinha muita gente e eu não aglomerei com ninguém,tomei um sol e um banho de mar. Voltei mais feliz pra casa.Até quando nós vamos continuar assim? Pergunto isso todo dia.Bjos!

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    1. Ane, você foi à praia, que maravilha!!!! Lugares abertos assim, onde estamos diante da natureza, não podem fazer mal. Mas há que fugir, realmente, de aglomerações, já que muitos não têm juízo rss. Lindo domingo para você! Bjs.

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  16. Marilene
    Estive 3 meses sem sair só supermercado e o mais urgente possível.Depois fui saindo aos poucos, e agora com todos os cuidados e com a máscara sempre na cara, lá vou mas, receio todos temos.
    Gostei da sua crónica.
    Bom domingo
    Beijinhos
    :)

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    1. Piedade, ainda estou em ritmo lento. A insegurança é grande. Quem me dera poder estar perto do mar!!!! Bjs.

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