31 maio 2011

DESEQUILIBRADA


                                                           

Quando consegui minha transferência para Belo Horizonte, depois de morar por mais de vinte anos em São Paulo, entrei em um redemoinho. A opção foi  minha e tive que batalhar muito para conseguí-la. Mas tudo era diferente. A começar pelo trabalho. Em São Paulo, o trajar era bem mais formal e, a meu ver, os advogados tinham uma preocupação especial com a elegância. Não que tivesse encontrado em BH advogadas mal vestidas, o contraste estava em certa informalidade, provocada, certamente, pelo clima. Fiquei surpresa por encontrá-las com vestidos descontraídos, coloridos, mais decotados. Tudo muito bonito, mas diferente do meu mundo anterior, onde estava, quase sempre, usando conjuntos, meias, saltos. E isso não acontecia apenas no jurídico da empresa, mas em quase todos os escritórios localizados na Avenida Paulista
                                                            

Outra situação que me causou estranheza foram as portas fechadas nas salas das chefias. Não estava acostumada a isso. Sempre entrei em qualquer lugar, logo após ser anunciada. E se houvesse urgência, entrava, ainda que Superintendentes e Diretores estivessem em reunião. Aqui, acabei surpreendendo secretárias, pois quando me avisavam que os superiores não podiam ser interrompidos, eu as ignorava, batia na porta e entrava. Trabalho é trabalho. Se havia necessidade,  meu assunto era mais importante que o da reunião deles, eis que eram todos amigos e em sua própria casa. Não via qualquer razão para adiar uma decisão urgente, para a qual era indispensável a anuência do adogado-chefe do jurídico.

Não tinha amigos e nem sabia, entre todos os colegas de trabalho, quais os mais confiáveis. E isso é deveras importante na esfera profissional. Eu acabara de chegar e não desejava me unir a quem não fosse bom profissional ou adepto a fofocas. Um novo aprendizado depois de anos de trabalho. Em São Paulo, conhecia a capacidade e a confiabilidade de cada um. E era minha obrigação esse conhecimento porque, por muitos anos, fui assistente-chefe no gabinete e precisava assessorar o superintendente, funcionar como um anjo da guarda, lembrando-lhe o que poderia ou não fazer, com quem contar,  que responsabilidades deveria assumir e seus riscos, na esfera legal.
                                                          

E namorava um médico (rss). Acho graça porque não me dou bem com esses profissionais. Mas com ele aprendi muitas coisas, principalmente a não me apavorar diante de algumas situações, saber que providências adotar, em outras. Ele fazia coisas que eu acreditava perigosas e ria de mim, afirmando que só são perigosas para os clientes. Mas é um grande profissional, sério, competente, professor em uma faculdade e, apesar do rompimento, um grande amigo, até hoje. Ele me chamava de DESEQUILIBRADA.  Porque????? Tinha suas razões. Logo que cheguei a BH, comecei a sofrer quedas inexplicáveis. Até acidente de trabalho. Escorreguei na tábua corrida encerada (uma loucura) de minha sala, me apoiei em uma grande e pesada cadeira, e caímos juntas. Fraturei o punho e fiquei com o braço imobilizado por um tempo. Mesmo assim, por ser o braço esquerdo, cismei de continuar trabalhando.  No dia de tirar o gesso, caí na escada (não havia aquela proteção exigida pelas normas de segurança, na ponta dos degraus). Aí foi pior, pois sofri ruptura de ligamento e tive que me ausentar por uns tempos. O advogado-chefe, quando telefonei do hospital para informar o fato, brincou que ia me devolver para SP porque havia recebido uma advogada "bichada"
                                                             

Quando pensei que tudo estava bem, que minha vida entrara nos eixos, saí com meu namorado para jantar e... mais uma . Quando íamos embora, levantei da cadeira, perdi o equilíbrio e lá fui ao chão, mais uma vez. Só que essa foi terrível. A cadeira quebrara um copo e caí sobre ele, rompendo uma artéria e sofrendo uma lesão neurológica. Se não estivesse com um médico, poderia ter morrido. Ele adotou as providências para conter a hemorragia, me levou ao hospital e fui imediatamente atendida. Mas sofri por quase um ano. Não conseguia firmar um dos pés no chão. Sentia um choque horrível. Tinha medo de atravessar uma rua. E só podia andar de chinelos, o que para mim era um escândalo. Nem queria sair de  casa. Como uma mulher pode estar elegante usando rasteirinha?
                                                              
Assim, fiquei com esse apelido : DESEQUILIBRADA. Mas só em família, lógico. Depois tive uma explicação psicológica para as ocorrências. Eu estava, realmente, desequilibrada. Mas pela mudança. Pelas alterações que a nova vida me trouxe. Havia perdido, de certa forma, meu rumo, minha estabilidade emocional. É verdade que não existe nada que o tempo não cure . Embora grandes mudanças sejam difíceis, podemos nos adaptar às coisas novas, descobrindo o lado positivo delas, e  me estabilizei. E não caio mais, viu????  Se sofrer uma queda, logo me levanto e sigo em frente. Passou o desequilíbrio e sigo minha vida, em outras bases. Em uma cidade mais segura e perto de meus entes queridos.




12 comentários:

  1. Muito bom seu texto, todo começo é um desafio.Beijos

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  2. Bom dia querida Marilene,

    Adorei o texto e sua capacidade de mostrar que podemos levantar de qualquer "tombo" ou situação, e como dizem por ai "dar a volta por cima"

    Você é uma guerreira e merece tudo de bom que a vida possa vir a te oferecer.

    Beijos
    Ani

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  3. Belo texto.
    Adoro mudanças...mas sofro também.
    Que bom que agora está mais feliz. O corpo agradece rsrs.
    Bjs, linda. Em divina amizade.
    Sonia Guzzi
    http://soniaguzzi.com.br

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  4. Meu ex chefe, meu marido e as pessoas do meu convívio, sabem bem que sou um perigo, me enrosco em todo lugar, tropeço, bato cabeça, sou estabanada mesmo, e o pior é que, no meu caso,não tem concerto. Não é falta de rumo, mudanças, estabilidade emocional, sou um perigo ambulante mesmo, contudo nunca é nada muito grave, felizmente. Agora no seu caso, mostrou mesmo que sabe levantar, sacudir a poeira e dar a volta por cima.
    Bj.

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  5. Oi Marilene,
    Nem preciso comentar, já que acompanhei passo a passo a sua "prosopopéia".
    Bitoca.

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  6. Olá!!!

    Passando para deixar um beijo e desejar a vc uma ótima tarde!!

    Espero por vc no Alma!

    Beijo!

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  7. .

    Fantástica exposição de ideias.
    Normalmente me atenho as informações
    mais curtas, sintetizadas, mas você
    domina a culta da norma e isso me
    instiga e fascina. Por isso eu li.

    silvioafonso




    .

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  8. MEUDEUS! Eu pensei que vc fosse morrer no fim =0
    Vou te dizer, saí da minha cidade por causa do trabalho do meu marido... E tinha (ou tenho) certeza de que não seria feliz aqui, será que minhas quedas ainda estão por vim!?
    Odeio esse lugar, e não há nada, mem ngm que me convença que a fincar raízes aqui, to contando os dias e as horas, pra dar uma banana *ah lá vilão de novela, no céu!
    Tem certas transformações que vão contra a qualquer auto-ajuda, aliás risquei essa modalidade dos meus dias, hahahaha!
    Adorei desequilibrada!
    Bjoo!

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  9. Nossa, nunca havia pensado que quando estivéssemos desestabilizados emocionalmente, o nosso corpo poderia refletir dessa forma. Curioso. Isso explica umas quedas que acabei levando numa determinada época da minha vida. É, eu também fico um pouco desequilibrada às vezes, rs. Todos ficamos. Quanto a você, ah, você é um luxo, no se vestir, na forma como usa as palavras, no design do blog, em tudo!

    Beijos, e aquela ansiedade pela sua volta a ativa depois dos problemas técnicos!
    Débora.

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  10. Afffff!!! Que situações derradeiras né Amiga! Achei legal que dividiu um pouco de sua intimidade com a gente... mas não gostei dos acontecimentos, claro. Acho aceitável a explicação do tal 'desequilíbrio', afinal, sinto em você uma sensibilidade extra que com certeza ultrapassa os limites da física, e estando em desarmonia provoca reações extra-físicas mesmo!! Que bom que agora está tudo bem...

    bjs

    Cat

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  11. Oi garota !!!
    Não se preocupe, todas nós (mulheres) temos um pouco de desequilibrada ...Sabe porque?
    Porque queremos ser perfeitas, somos imediatistas ... Amamos demais, sofremos demais, preocupamos demais ... tudo demais ...
    kkkkkk !!!
    E por acaso, sou de BH !!
    Seja bem vinda !!
    Bjsss

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  12. Olha só as coincidências da vida...Escolhi, por acaso, esse post antigo, pra lhe fazer uma pergunta. Tenho tentado lhe comunicar por e-mail, mas não estou conseguindo. É q suspeitei q pudéssemos ser parentes, já q tenho primos q não conheço e meu sobrenome é Duarte.

    Mas, ao ler seu texto, creio q vc é de São Paulo, não?

    Fiquei impressionado com o q vc passou, a quantidade de tombos. No final de 2009, eu quebrei o punho. Fiquei 41 dias engessado, do punho até quase o ombro.

    Tudo de bom, Marilene.

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