O que representa uma pétala? Por si só, nada. Partícula que se desprendeu de uma flor, em momento de despedida. Quando a tocamos, percebemos maciez e também beleza. Não se incomoda de ter sido levada pelo vento porque , ao nascer, já sabia da efemeridade de sua existência. Enquanto fazia parte do botão, a expectativa do desabrochar. Depois desse encantamento, o beijo das coloridas borboletas, que da flor sugavam o néctar adocicado em uma dança cheia de magia. Tudo perfeito, até aquela pétala que caiu aos meus pés, enquanto tomava uma taça de vinho na varanda da casa de uma amiga, e me levou a refletir sobre beleza, tempo, importância da vida.
Já fui botão, já desabrochei, já exalei perfume e já mostrei entusiasmada vida a quem me observou, comigo conviveu, me amou ou nutriu por mim sentimentos negativos. Ao contrário do que ocorre na natureza, não gosto de pensar em efemeridade e sei que não consegui despertar em todos um olhar de luz, de contentamente, de afeição. Algumas vezes sequer me preocupei com isso, mas em outras me senti magoada com demonstrações de falta de empatia, de incompreensão, de críticas e, o pior, da sensação de invisibilidade.
Já perdi pétalas pelos caminhos. Podem ter sido guardadas com ternura ou talvez jogadas ao lixo. Foram elas minhas experiências de vida, meus passos, meus atos, minhas palavras... partes de mim cuja ausência não prejudica o todo hoje ainda existente, exceto pelas cicatrizes. Sei que muitas outras vou perder pois isso faz parte da jornada. Ao contrário das flores que, após se abrirem lindamente, fenecem rápido dando lugar a outras, permanecemos no jardim por longo tempo, mas passamos a cultivar o medo do vento e das tempestades, em vista da fragilidade que os anos nos impõem. O desapego é fácil quando se trata de bens materiais, mas duríssimo quando olhamos as pessoas que amamos, independente do tempo em que estejam nesse jardim. Desejamos um convívio eterno, ainda que todos percam suas pétalas e precisem de cuidados especiais.
Passamos por muitas mudanças, colecionamos conquistas e também perdas, saboreamos alegrias e derramamos lágrimas frente às frustrações. Vivenciamos os dias de forma diferente e percebemos que nosso olhar se torna cada vez mais sensível a tudo que nos cerca. Abraçamos o que é de fato importante e lidamos melhor com os imprevistos. Chegamos a um ponto em que , mesmo que as fotos estejam descoloridas, nós as valorizamos por demais.
Como parte desse jardim onde todos estamos inseridos, continuamos a sonhar e não perdemos o encantamento que nos oferece a vida. Aquela pétala desgarrada, vou colocar dentro de um livro, relembrando antigos hábitos, para que me lembre, sempre, que são as pequenas alegrias, notadamente as advindas do amor a tudo e a todos, que nos permitirão , mesmo perdendo o ritmo, continuar essa dança maravilhosa do existir.
Tudo culpa do vinho!!!
Marilene