28 janeiro 2021

A ROTINA DO NADA

                                                          (  Cayetano Arques )

                                   


Desperto, quase todos os dias, com o toque do telefone. Ligação que não vou atender, mas que interrompe meu sono. Tento adormecer novamente, já que deito tarde e preciso dormir, mas logo depois o maldito telefone toca de novo. Pelo número que chama vejo que é de algum banco a oferecer crédito ou outras bobagens relacionadas a cartão. E  fico irritada, logo de manhã, porque a insistência deles é enlouquecedora. Essas chamadas vêm pelo fixo, cujo número mudei, pelas mesmas razões. Mas descobriram o novo!!!!

O celular, desligo ao ir para a cama. Quando eu o ligo fico pasma com a quantidade de ligações não atendidas ali registradas ( cujos números vou bloqueando), fora a de mensagens, até do exterior, informando que recebi prêmios, assim como comunicados de ofertas de lojas onde nunca entrei.
 
Penso no que vou fazer durante o dia... nada. Não gosto de cozinhar e não quero mais ficar limpando armários, o que fiz no início do confinamento. A faxineira retornou e, embora de forma insatisfatória para mim, mantém o apartamento em ordem. Deixo recados na geladeira quando algo ignorado por ela  precisa ser feito.
 
Depois do banho fico em dúvida se vou a algum lugar. Não há opções, posso escolher entre mercado e padaria. Mas não estou precisando de nada. Outra vez... o nada.
 
Minhas roupas, quando abro os armários, estão como eu, ansiosas por dar um passeio e fugir da rotina de ficarem paradas ali dentro, sem utilidade.
 
No escritório, observo o grande número de livros. A maioria já li, mas outros tantos ficam a me chamar, insistentemente. Tenho fases de leitora voraz e outras de preguiça mesmo. Tudo que se apresenta como atividade requer que me acomode em um sofá. Meu corpo já está inconformado com o tempo que passo ali. Cutuco a mente para encontrar uma variante e o que encontro??? Nada!
 
Nunca fui de me dedicar a exercícios físicos e meu bairro, como a maioria dos de Belo Horizonte, têm morros, característica do estado de Minas Gerais. Para caminhar, teria que ir a um parque, ideia, no entanto, de todos. Aglomerar, Deus me livre!
 
Até sinto saudade da época em que trabalhava, pois havia que cumprir horários e correr de lá para cá, sem ver o tempo passar. Hoje, correr para onde? Para que? Fico sem esperar nada do dia, embora seja grata a cada amanhecer, por mais um despertar.
 
Estou vivendo uma rotina estranha, a do nada. Nada para fazer, nada para programar, nada para esperar, nada para sonhar, nada para realizar...
 
Nada! Nada!

A rotina de nadar dentro do nada...


                                                                 Marilene



22 comentários:

  1. Puxa, que coisa...Me viu nas tuas palavras! Temos dias que parecem durar anos, pois a mesmice é fatal... triste isso e assim, seguimos esperando a libertação que deveria chegar pelas vacinas. Mas... Sabemops como o Brasil tá na foto!AFFF! Lindo teu texto! bjs, tudo de bom,chica

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    1. Fica tudo igual rss e não encontramos nada para estimular. Mas sou feliz por estar bem e ter meu lindo cantinho para ficar. Bjs.

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  2. Não deixe que se instale o vazio. Haverá, por exemplo, alguma coisa para aprender (a internet está cheia de tantas coisas)... ou para fazer (e que tal escrever um livro?)...
    :)

    Fique bem.
    Beijinhos.

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    1. Fá, adoraria escrever sobre coisas belas, mas a inspiração não vem rss. E olha que tenho evitado noticiários!! O que mais me incomoda é ficar mais tempo que o considerado não prejudicial na frente do computador e da TV. Gosto de escrever, mas aos poucos, quando as palavras me chamam. Grande beijo!

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  3. Olá, Marilene, ao ler essa sua bela crônica fiquei pensando na possibilidade de existirem milhares de Marilene atravessando essa terrível pandemia com todas as novas regras sociais, como o uso de máscaras, coisa antes nunca imaginada por nós, o uso constante de álcool nas mãos, o uso de sabonetes, e o som da máquina de lavar as roupas que com elas saímos à rua. Estamos pois, como dizem, vivendo "um novo normal". Valha-nos Deus!
    Parabéns por essa bela crônica, Marilene!
    Um bom final de semana, com saúde.
    Grande abraço.

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    1. Pedro, além das incertezas, a monotonia rss. Você mencionou máquina de lavar e, nesses tempos, é fácil ouvir esse som, diariamente, já que a maioria de nós está em casa. Uma psicóloga, amiga de minha sobrinha, disse que nunca atendeu tanta gente, pois dias vazios provocam pensamentos em excesso. Muito obrigada por sua presença e comentário. Grande abraço!

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  4. Olá...
    Então, uma grande reflexão no seu texto, Marilene. Todos vivemos uma rotina tão indefinida e conflituosa. Esperas e escolhas diárias para dar significados ao tempo que não para!... O jeito é mesmo seguir de fé em fé, de força em força e respirando com perseverança, aguardando respostas dos Céus.
    Mas, com amor e humor tudo vai ficando mais leve e melhor...
    Meu abraço nesta sexta-feira...

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    1. Anete, o tempo passa e não nos permite realizar nada de diferente. Talvez isso até seja bom, pois significa que estamos bem, apesar das inúmeras reflexões que ele nos traz. Um ótimo sábado para você! Grande abraço.

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  5. Permita-me Marilene, mas essa sua rotina não é benéfica.
    Adora escrever e escreve tão bem, adora fotografar, duas artes que decerto a tiram desse "nada".
    Fazer alguns exercícios em casa, simples, leves, relaxantes, há imensos on-line. E filmes ou séries, outra maneira de passar o tempo (; ?
    Eu, por outro lado, não tenho tempo e infelizmente às vezes saúde, para fazer tudo o que queria e gosto, mas vou aos poucos tentando ...
    desculpe-me a ousadia.

    Um beijinho e bom fim de semana

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    1. Fernanda, querida, você não foi ousada. Manifestou, de forma clara, não ser essa uma rotina salutar, com o que concordo, plenamente. Sempre fui agitada, ansiosa, sentindo ter pouco tempo para fazer tudo rss. Agora, ele está sobrando, mas continua passando, sem nos libertar. Eu vejo filmes, leio, escrevo, sempre fotografo algo quando preciso sair, mas há um enorme desejo de fazer mais que isso, principalmente estar com meus irmãos, sobrinhos, amigos. O hoje tem me deixado carente, razão do meu "nada". Grande abraço, amiga!

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    2. Compreendo querida Marilene, esse seu/meu/nosso "nada" é bastante mais profundo.
      Não está fácil, por isso a importância de desabafar, os blogues têm-me ajudado muito nisso.

      Abraço apertado!

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  6. Forte, Marilene, mas condizente com o momento que vivemos. Beijos.

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    1. Momento tão estranho, não é Sérgio!!! E eu fico divagando rss. Abraço.

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  7. Sem dúvida que estamos todos mais limitados nas nossas ações. A solução é termos de nos reinventar da forma mais criativa possível.
    Abraço solidário.
    Juvenal Nunes

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    1. Juvenal, ora estou no avesso, ora no lado tido como o certo rss. Os dois mostram a mesma coisa... nada!!!! Limitações nos emperram rss. Obrigada pelo comentário. Abraço.

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  8. Nossa mãe... primeira vez que todos somos iguais! O "NADA" está mais presente do que nunca. Não é que não tenha nada para fazer, é que não sinto vontade de fazer coisa nenhuma, amiga! Um tédio. Na verdade ando fazendo sempre as mesmas coisas, e uma ideia fixa permanente, vou para meu roupeiro e começo a pensar nas coisas que não uso, que nunca irei usar e... sacola nelas! Quando desço faço a alegria dos pobrezinhos. Quando volto, abro, e vejo que não saiu o suficiente, tem roupa da época das cavernas, ainda. Bijuterias que não uso. Bolsinhas que não me são simpáticas mais, pois preciso levar comigo toda a casa dentro de um bolsão. E a papelada, Marilene? Tiro de uma caixa e coloco noutra para separar, estou separando desde o princípio do confinamento. Terrível esse apego. Passeio pelo bairro, evitando entrar em lojas, saio de máscara, óculos escuros para não ser reconhecida e parar para as conversas. Uma neura! Invento umas coisinhas para o lanche da noite... A minha faxineira ainda não voltou, quem está fazendo? Euzinha. Mas, amiga, estou a esperar a vacina, que só vai resolver quando grande parte da população também estiver vacinada. A melhor hora é quando estou lendo ou escrevendo, aí vem a criação que estimula.
    Enfim...estamos iguais, todos separados e unidos pela mesma causa!!
    Bela crônica, adorei! rss
    Beijo, um bom fim de semana...em casa!!!

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    1. Tais, aqui está tudo fechado e dá até tristeza andar por suas "abandonadas". A Vera, minha irmã, disse que deprimida ao ver a paradeira. O problema reside, de fato, na falta de vontade de fazer alguma coisa, pois tudo é igual rss. Também tenho feito limpeza em papéis, rasgando um monte. Escrever e ler ainda são os únicos prazeres. Que venha logo a vacina, para nos tirar desse marasmo. Muito obrigada, querida, por seu testemunho. Um ótimo final de semana também para você! Grande abraço.

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  9. Gostei deste exame à sua rotina.
    Apesar de um pouco desagradável por lhe interromper o sono
    :-)

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    1. A ociosidade é prejudicial rss. E ela está morando na rotina. Abraço.

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  10. Olá, querida amiga Lena!
    Essa rotina só mesmo preenchendo com Poetizando leve.
    Escrever faz um bem enorme e você faz isso muito bem, com toda reflexão.
    Esteja bem, amiga.
    Beijinhos

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    1. Obrigada, querida! A rotina está muito estressante. Bjs.

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  11. Vivo a rotina de não ter vontade de fazer nada,de me cansar facilmente, e viver cada dia sem expectativas.
    Morei em Goiás (sozinha) quase seis anos,minha rotina sufocava meu tempo. Mas a fadiga sempre foi minha companheira.

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